domingo, 18 de abril de 2010

Em mãos:

“Minha querida filha: seguramente te haverás interrogado em mais de uma ocasião sobre as causas do meu silêncio e, como é lógico, ficaste sem resposta exata. Eu poderia dar-te essa resposta, visto que já és uma mulher, capaz de ver as coisas tais como são, porém, em razão de tudo que seja, nasceste e vives em um país de liberdade e não é necessário perturbar a tua mente jovem com relatos deste diabólico sistema, obstinado em impedir os mais elementares direitos humanos de comunicação. As razões? Falaremos algum dia a respeito disso e estou certo que as compreenderás; neste momento, porém, e apesar do muito que desejo saber de ti, nem sequer te pelo que me escrevas. Teria de fazê-lo uma centena de vezes, na remota esperança que deram quanto a uma de tuas cartas, mas essa teria de ser portadora de alguma notícia má. Só assim chegaria às minhas mãos, e não seria por humanidade, senão por insanidade, para que se regozijassem uma vez mais. Nessas condições, é preferível renunciar à comunicação e não permitir seja ela utilizada como arma de pressão e chantagem, Elenita, não importa que passe o tempo: Um dia virá, e verdadeiramente já falta pouco! Enquanto não chega, continuarei conservando em minha lembrança teu formoso riso de menina travessa, sim! Essa menina que me fez companhia em todos esses anos de brutal cativeiro e cujas escassas fotografias tenho sabido defender com unhas e dentes, para evitar que me sejam arrebatadas. E é lógico que assim seja, pois meu próprio sangue, e, apesar da distancia sempre te hei sentido perto de mim. Bem, recebe meu carinho, o espaço que me concede mão amiga é muito limitado e não me é possível estender-me. Confio em que estas letras possam cruzar o charco e chegar até a ti. Nelas vai todo um rosário de beijos e espero que num futuro bem próximo te possa abraçar. Adora-te o teu pai.”

Eloy Gutierrez Menoyo, preso político de Havana!


Eu juro que poderia deixar essa carta, que fiz questão de digitar letra por letra, falar por si só, extraí de um livro de cabeceira que se chama “Cuba, num retrato sem retoques” do Autor brilhante Luciano Bivar.
O que me assusta mais é que esse livro é de 1986, provavelmente esse senhor morreu e provavelmente muitos outros morreram, não só em Cuba, mas em todas essas Ditaduras instauradas mundo a dentro.
No Brasil aconteceu, e continuaria acontecendo se a outra ditadura derrubasse a militar, mas isso não é assunto pro momento.

O assunto do momento é a possível ditadura da situação, onde o Partido do Governo tem plenos poderes e ele quem dá as cartas, por aqui...

Mas ao ler esse texto o que mais me incomodou, não foram meus olhos marejados pela triste história que esse pai foi obrigado a fazer parte, por simplesmente...Discordar!
O que me impressiona é a cumplicidade que o governo do meu país tem com essa gente, como já postei por aqui...
Será que a continuidade dessa gente na nossa representação, é válida?!
Ainda conversaremos sobre isso, me aguardem...

Sem mais.
Mario Tito.

Um comentário:

Mariana Ribeiro disse...

Fiquei arrepiada lendo! Até hoje existem histórias assim... até quando existirá?!